20.9.10

A joalheria como poética (2): Cildo Meireles

Se voltarmos alguns séculos atrás, ou se olharmos para o surgimento da civilização, veremos que as joias e talismãs estiveram sempre presentes entre homens e mulheres. Os  metais nobres e  as pedras preciosas como o diamante, a safira, a esmeralda, o rubi... fascinam e despertam  o desejo pelo belo. O  belo, que para Charles Baudelaire é constituído por elemento eterno, invariável, cuja quantidade é excessivamente difícil determinar, e de um elemento relativo, circunstancial, que será, se quisermos, sucessiva ou combinadamente, a época, a moda, a moral, a paixão[1]. Para Wassily Kandinsky, esse belo de que  o artista é o sacerdote deve ser procurado apoiando-se no princípio do valor interior (...) É belo o que provém de uma necessidade interior da alma[2].

Em Cildo Meireles, artista plástico carioca que iniciou seus trabalhos conceituais na década de 60, além da referida necessidade interior da alma, podemos dizer que o belo existe como fisicalidade, da relação do objeto com o espaço, como por exemplo no trabalho Cruzeiro do Sul, 1969-1970.

Cildo Meireles, 1969-1970, Cruzeiro do Sul > Cubo de madeira, sendo uma seção de pinho e outra de carvalho, 9 x 9 x 9 mm.
Cruzeiro do Sul(1969-1970), é um cubo minúsculo formado  de pinho e carvalho, duas madeiras que, quando entram em atrito produzem fogo, teriam o poder de invocar o divino na cosmogonia dos índios Tupi e de quase as civilizações da América do Sul. Tal cosmogonia foi ameaçada pela catequização dos Jesuítas. O objeto, escultura minúscula, é colocado na imensidão de uma sala vazia... uma instalação que sintetiza fogo e divindade.
Além da relação do objeto com o espaço, Meireles busca também a relação do objeto com o corpo, nesse sentido a escala do objeto muda completamente quando ele busca o suporte do corpo... no movimento entre espectador e obra.

Em Condensados, o artista busca na joalheria a expressão plástica de seu trabalho, a poética é construída em uma série de anéis realizados na década de 70 em diferentes materiais. Quando ele começou a produzir a série, não tinha uma preocupação política imediata, estava envolvido com questões formais e cerebrais. Um dos trabalhos realizados na época é Condensado II – Mutações geográficas: fronteira Rio/São Paulo, 1970. 








Cildo Meireles, 1970. Condensado II – Mutações geográficas: fronteira Rio/São Paulo. Terra, prata, ônix, ametista e safira
Um pouco mais do trabalho e do processo criativo de Cildo Meireles...




[1] BAUDELAIRE, Charles. Sobre a modernidade. São Paulo : Paz e Terra, p.10, 1997.
[2] KANDINSKY, Wassily. Do espiritual na arte. São Paulo : Martins Fontes, p.127,128, 1996.




postado por Aglaíze Damasceno

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