13.4.11

As coisas e as palavras


Para dar continuidade às ideias apresentadas no texto anterior e articular o discurso (as palavras) à produção (as coisas) destaco algumas peças, dentre tantas outras possíveis, que possibilitam tornar mais evidente a produção joalheira no campo da arte. 

Como explicitado anteriormente, trata-se de uma abordagem poética no território da arte contemporânea, cujo papel suplanta o território da beleza para habitar outras formas de sensibilidade, produzindo deslocamentos e criando novas subjetividades.  Um dos aspectos que se evidencia na produção artística contemporânea de qualidade, segundo Suely Rolnik, é que nela “explicita-se de modo mais contundente que a arte é uma prática de problematização: decifração de signos, produção de sentido, criação de mundos”.

Remetendo essa abordagem à arte-joalheria, Cristina Filipe ajuda a delinear os contornos dessa prática ao citar Manuel de Castro Caldas: “Não há qualquer segredo no fato de uma jóia não parecer uma jóia ou de uma pintura não parecer uma pintura. Porque já não existe o campo prático da joalheria ou da pintura como demarcações reais e exatas, existem os campos práticos onde se "trabalham" as questões da jóia e as questões da pintura. (...) E o que for trabalhado a partir do campo A ou B mantém relação com esse campo, isto é, o urinol de Duchamp é uma não-pintura (antes de ser uma escultura) porque um pintor (Duchamp) renegou a pintura nessa obra (...) ”(O que é (afinal) uma jóia? - UNICAMP – set 2010).

Nesse sentido noções tão caras à joalheria, tais como distinção, beleza, ornamentação, decoração, apenas para citar as mais evidentes, são abordadas, criticadas, questionadas e ressignificadas pela arte-joalheria, sendo aí depositada sua essência, seu valor, sua preciosidade e sua beleza.

Assim, sobre a idéia de singularidade e distinção, algumas peças de Gijs Bakker (anos 70) e Gerd Rothmann (anos 80). 
Gijs Bakker

Gijs Bakker

Gerd Rothmann




‘Bootle Neck Chain’ (1988), de Bernhard Schobinger, remete o pensamento aos significados e riscos da ornamentação. 


Bernhard Schobinger




Sobre noções de ornamentação e decoração, novamente Gijs Bakker (1982) e Otto Künzli (1984)


Gijs Bakker
Otto Künzli

Sobre o excessivo apego à preciosidade dos materiais o bracelete ‘Gold makes you blind‘ (1980), também de Otto Künzli, (feito de borracha contém, em seu interior, uma esfera de ouro – Será?).
Otto Künzli


‘Terrifying Beauty’(2009), de Burcu Büyükünal, explicita o quão deformada pode ser a noção presente nos esforços contemporâneos em busca de uma aparência idealizada, evidenciando o atual sentido distorcido da ideia de beleza.




Concebida para tornar belo, a jóia simboliza a estetização das coisas relativas ao corpo. As formas da beleza, transformadas historicamente, culminam na contemporaneidade para uma obsessão que permite confundir aparência com existência.  

Para concluir, reforço novamente a importância de compreendermos as distinções entre as diversas abordagens presentes na produção joalheira contemporânea, o que não significa estabelecer uma hierarquia de importância ou valor. Tampouco revela-se uma intenção de tornar unânime a arte-joalheria como campo de interesse e atuação para todos. Trata-se apenas de apresentar diferenças e reconhecer que, nesse tempo permeado de interfaces, cruzamentos, diálogos, muitas vezes é estratégico fazer transitar qualidades e valores de um campo ao outro indiscriminadamente. Nesse sentido é preciso estabelecer parâmetros para uma análise criteriosa, já que as multiplicidades abarcam, como tudo, aspectos positivos e negativos, não devendo ser observadas de modo acrítico.

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