28.8.10

DESIGN E HERANÇA ARTESANAL NO BRASIL

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Gostaria de comentar aqui a relação que vemos no Brasil entre a herança artesanal e o design. Podemos dizer que muitas das nossas técnicas de artesanato são heranças da tradição indígena e portuguesa estão muito associadas ainda hoje a uma produção de subsistência e a produtos para turistas.  Essas peças, por manterem suas características formais presas à tradição, muitas vezes parecem desatualizadas, “coisa da vovó”.
Nesse campo algumas ações governamentais foram realizadas no sentido de implementar novos valores a essa produção, tais como o desenvolvimento de projetos de tecnologia vernacular , a exemplo do trabalho de  Gui Bonsiepe nos anos 80.  Desde os anos 90 até hoje o SEBRAE realiza ações com a intenção de tornar mais competitivos os produtos de origem artesanal, gerando mais renda para as comunidades. Essa ação tem como base a participação de designers nas comunidades, conhecendo os artesãos e as técnicas e promovendo o desenvolvimento de “novos produtos”, mais atraentes para um mercado cosmopolita interessado em produtos étnicos. Atua também na formação de cooperativas e incentivo ao empreendedorismo.

O resultado desse trabalho pode ser visto em várias lojas das principais cidades do país. Estas lojas oferecem produtos para os clientes interessados em um "consumo sustentável", cujo desdobramento social se torna um grande diferencial.  Há também os clientes que valorizam produtos de artesanato por sua importância e riqueza cultural e até mesmo para aqueles que procuram coisas “descoladas”, objetos distintos da produção em massa.

Meu interesse aqui não é levantar bandeiras a favor ou contra qualquer uma dessas ações. Para isso já existem aqueles orientados por uma diretriz mais purista, que condenam a perda das raízes que essa modernização pode trazer ao legado histórico dessas práticas. Ou ainda aos que vêem numa intervenção de design a possibilidade de inovação e preservação de técnicas e profissionais que, por não serem valorizados em si, podem desaparecer extinguindo assim esse legado da tradição artesã.

De fato argumentos não faltam, mas o ponto que quero abordar aqui é o caminho inverso. Não se trata do pensamento projetual (design) orientar e transformar o artesanato, mas sim da influencia que o este vem sendo para a produção industrial. No mundo todo é possível ver isso acontecendo, numa espécie de revival dos valores humanos que o produto artesanal pode trazer para o terreno industrial.  No design de mobiliário, por exemplo, poderíamos pensar Patricia Urquiola e Marcel Wanders
 


Também pude constatar essa aproximação por aqui na visita à exposição Design Brasil – 101 anos de história, no Museu da Casa Brasileira. Seu objetivo era trazer um panorama da produção do design brasileiro no sec. XX, com grande ênfase em mobiliário e objetos para o lar. Dentre as peças estavam produtos desenvolvidos por comunidades de artesãos em parceria com designers - Renato Imbroisi, Paula Dib, Heloisa Crocco e Lars Diederichsen - exemplos de ação do SEBRAE.                        




Já no cenário da joalheria brasileira me parece que isso acontece de forma menos efetiva. Tenho visto o grande destaque dado ao uso de sementes e madeira na confecção de ornamentos sob a nomenclatura Biojóia, evocando um" apelo verde " para o campo. Os resultados parecem-me muito mais apoiados na beleza dos materiais que nas inovações em seus arranjos. Os produtos não são frutos de uma tradição artesanal, apenas utilizam recursos naturais exóticos que são de grande apelo comercial. Podemos continuar o raciocínio falando do uso do belíssimo capim-dourado, original da região do Jalapão (TO). Sua principal característica é a cor que lembra o ouro e as sua palha é utilizada para fazer artesanato. Simplesmente adicionando-se pinos, fechos e argolas, essas peças transformam-se em ornamentos que diferem de bolsas, cestos e sousplats apenas pela questão da escala.
     


Outro modo bastante comum é uso do artesanato como fonte de inspiração para coleções de jóias. . Exemplos disso podem ser conferidos em peças premiadas nos concursos de joalheria no Brasil. De fato, a riqueza de nosso repertorio cultural e tradição artesanal tem gerado belos produtos no campo da joalheria, mas que não ultrapassam a linha da aplicação e da reprodução.


Eu acredito que os investimentos seriam interessantes também para promover o desenvolvimento de uma categoria que o próprio SEBRAE chama de artesanato conceitual, que está muito vinculado ao campo da arte e cujo principal elemento é a inovação produzida por artistas cujo trabalho tem uma coerência temática e filosófica com sua própria visão de mundo.


posted by Ana Paula de Campos

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